Anúncios google

quarta-feira, abril 08, 2009

Horizonte



Por vezes, na languidez adormecida de um olhar sem objecto, surgem razões e filosofias, vindas de um nada criador, herdeiro do próprio Nada de onde o Tudo veio. Os sinais existem, o mundo é um largo livro de páginas soltas onde podemos ler a Vida, os Segredos e o Mistério. Vi o mar e o céu tocarem-se naquela linha imaginária a que se convencionou chamar de horizonte. Vi-o, lá bem longe, porque o horizonte tem o condão de sempre se afastar, ainda que viajemos à velocidade da luz na tentativa de o alcançar. O horizonte é inatingível como o sonho último, a última fronteira. Lembrei-me de algo curioso. Afinal, o horizonte pode ensinar-nos algo muito simples: viver, é precisamente estar nessa linha imaginária na qual o Céu e a Terra se tocam. Somos o ponto de encontro, o vértice, a aresta onde confluem o Céu e a Terra, o material e o imaterial – há quem lhe chame espiritual -. Nunca poderemos compreender-nos verdadeiramente porque nunca nos poderemos ver de fora, como se fossemos ao mesmo tempo observado e observador. Não podemos ver o horizonte da nossa própria existência, porque verdadeiramente nele estamos inseridos. Sem termos consciência, estamos ligados ao mundo de cima e ao mundo de baixo. Somos o quadrado – 4 elementos – cujos vértices tocam no círculo – infinito -. Somos verdadeiros homens de Vitrúvio ao jeito de Da Vinci; somos verdadeiros herdeiros de todas as grandes cosmogonias do passado, fossem elas mito ou realidade, sonhos, fábulas ou alegorias. Somos ao mesmo tempo filhos do pó da terra, e do pó das estrelas! Na verdade, do pó viemos, e ao pó havemos de voltar, a esse mesmo Pó caótico de cuja massa os mundos são feitos. O corpo anseia pela corporalidade, a mente pela imaterialidade; o corpo é material, e é a materialidade que o atrai; o que podemos chamar aquilo que em nós procura o imaterial? Alguns chamaram-lhe alma, outros espírito. Seja o que for, é aquilo que nos torna verdadeiramente humanos. Talvez nem faça sentido que a questão se coloque em termos de existência ou não existência de Alma. O imaterial e o inextenso existem de facto na medida em que somos herdeiros de ideias, sonhos, ideais, e não apenas de genes e determinismos biológicos. Não se pode conter uma ideia, senão dentro de um livro, ou seja, só as palavras podem conter a imaterialidade da ideia. As palavras são como que portas abertas entre o mundo imaterial e o material. É através delas que o imaterial penetra no material, e por elas modela o mundo à sua própria imagem.

Sem comentários: