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sábado, outubro 08, 2011

Da especificidade da educação filosófica



A especificidade da educação filosófica está em devolver ao homem, em todas as épocas, independentemente do contexto histórico, social, económico ou político, o ónus da reflexão crítica, serena e universal acerca de si e da sua circunstância, da sua humanidade e das obras que são fruto da sua condição de “animal de projetos”. O projeto educativo da filosofia deve ser o de “religar”, não num sentido religioso e doutrinário – atitude nada filosófica -, mas no sentido de devolver ao homem uma perspetiva universal do conhecimento e da sua face mais utilitária – a técnica. O objetivo não passa por ensinar a fazer ciência, engenharia ou medicina, mas o de assumir uma postura desconstrutiva – que não é o mesmo que destruidora – perante o “saber construído” no sentido de fornecer instrumentos críticos que permitam, em todos os momentos, a compreensão global de um problema, um conceito, uma teoria ou um método. Não que o aprendiz de filósofo tenha de saber tudo acerca de tudo. Há séculos que a Filosofia deixou de ser ao mesmo tempo ciência da natureza, medicina, retórica, ou ética. O progresso do conhecimento nas diversas áreas conduziu-as à especialização e ao seu extremo – o isolamento. A insularidade das áreas da técnica e do conhecimento só poderia conduzir, em última análise, ao desconhecimento mútuo e a fragmentação do próprio humano. Assim, a especificidade da educação filosófica está em promover uma atitude fundamental, e não a aprendizagem de um corpo de conhecimentos mais ou menos científicos ou doutrinários. Essa atitude baseia-se em dois pilares originais – universalidade e radicalidade.

Universalidade sem radicalidade é universalismo; radicalidade sem universalidade é radicalismo. Noutras palavras, para assumir uma atitude crítica, racional e bem fundamentada, é preciso compreender o objeto que se crítica. É preciso ter uma ideia geral acerca do contexto em que se insere o problema/método/ideia, e do modo como esta se relaciona com outros problemas/ideias/métodos. Isto porém, não chega. Não passa de universalismo. É preciso radicalidade, e ser radical é “ir à raiz”. Em termos filosóficos, é preciso ir às “causas”, conhecer os “princípios”. Na mesma medida, a aprendizagem da atitude filosófica deve consistir num constante diálogo com a Origem, as bases do pensar filosófico que são, em última análise, os alicerces fundamentais onde assenta toda a estrutura da ciência e do pensamento hodierno. Tudo isto por uma necessidade de progresso, e a Filosofia não é inimiga do progresso, senão de um progresso estropiado, deficiente e unilateral. A educação filosófica, através do desenvolvimento de uma atitude desconstrutiva, crítica, radical, dialógica, aberta a todas as áreas de saber, tanto ao nível das disciplinas de pensamento sincrónicas bem como das suas congéneres diacrónicas, promove um progresso verdadeiramente humano, para que o homem na sua integralidade não perca o norte de si mesmo, não caia no esquecimento da sua humanidade em prol de uma qualquer outra entidade científica, política, ou de um ideal que vise o homem como um meio, e não como um fim.

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