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quarta-feira, agosto 31, 2005

Síntese Perfeita

A genialidade está na síntese perfeita. Toda a mente que logra juntar aquilo que parece inexoravelmente separado, é verdadeiramente sublime.

No mundo em que vivemos, e desde sempre, sobejam as ideologias, as crenças, as verdades, os dogmas. Para evoluir teve o homem que subir os degraus da seu próprio engenho, fantasia, e razão. Foram religiões, filosofias, teorias cientificas; paradigmas por vezes tão efémeros como o mundo, mas sempre herdeiros de uma qualquer verdade tácita, essencial, que nunca morre, e ao longo dos tempos foi cimentando tudo aquilo a podemos chamar cultura humana.

A cultura humana é uma cultura de culturas. Todas estas são expressões de contextos históricos longos, que derivam por vezes das primeiros fenómenos de sedentarização humana, e como tal, de civilização.

Mas para os tempos que vivemos, em que urge criar uma consciência universal, que tudo compreenda, tudo ame, e tudo consiga, o extremismo e isolamento serão a melhor aposta?

Para melhor eliminarmos a ideia primitiva do extremismo, temos que avaliar as suas raízes humanas e biológicas. Nos primórdios da história humana era-se extremista por sobrevivência. Era-se radical porque ser-se o oposto significava morte e extinção. As primeiras comunidades humanas dividiam-se em tribos guerreiras, sempre dispostas à guerra e ao conflito pela soberania. Mesmo posteriormente, na idade média, nas cruzadas, em que as religiões eram tomadas cada uma como a verdade absoluta à qual todas as outras se deviam sujeitar. E no campo das ideias, das ciências e do pensamento, quantas vezes urgia defender uma tese para que não caísse nos esquecimento, e não se vergasse à ignorância e à incompreensão.

Este ponto é essencial: o extremismo como forma de sobrevivência.

Portanto, se o objectivo é criar uma civilização aberta, cultural, e global, não me parece que o extremismo seja a chave, pois enquanto cada um considerar a sua verdade como a única verdadeira e absoluta, nunca haverá espaço para uma compreensão maior e universal da realidade em que vivemos, e na qual somos meros actores. Nada existe per se; nada é independente de nada. Tudo o que existe não é mais do que uma rede gigantesca que tudo liga e tudo atravessa. Só aos nossos olhos existe diferença e separação. Como tal, devemos entender as verdades individuais como expressões legítimas mas incompletas da realidade e do mundo. Mundívidências, se assim pudemos dizer. O objectivo de toda a ciência, religião e filosofia é um só, e se aspiramos a uma teoria universal não podemos negar nenhum deles.

Considerar a verdade como uma parte do todo é desde logo anulá-la. Por isso os dogmas são perigosos. A Verdade é a essência de tudo o que há de comum entre todas as coisas. O Extremismo é uma característica perfeitamente anacrónica, a não ser que implique casos extremos de sobrevivência, como existiu no passado.

No mundo de hoje também está em causa a sobrevivência humana, mas essa não aspira a ideias fechadas e dogmáticas. Aspira sim a um entender superior da essência das ideias e do mundo.

É absurdo que cada um considere a sua religião a melhor do mundo, quando cada religião é em si mesma um convite à universalidade. Só uma mentalidade mesquinha transforma uma religião, em si mesma tendente à universalidade e ao espírito, num conjunto de rituais humanos e incompletos, e como se não bastasse considera este conjunto de rituais melhor que o do seu próximo. Repito: à que atender à essencialidade, e neste caso ela é Espírito.

Na mesma linha, um ideólogo não pode considerar o seu sistema político o melhor do mundo se este der espaço apenas para a Liberdade, e nenhum para a Igualdade, ou todo à Igualdade e nenhum à Liberdade. Do mesmo modo um cientista ou um filósofo devem ter a preocupação de dar às suas teoria o mais possível de universalidade e transversalidade possível, e não ter medo de recorrer à religião ou a qualquer outra metafísica.

A ciência, a religião, a arte ou qualquer outra metafísica são incompletas quando exploradas de forma individual. Tornam-se cegas, extremistas e acabam por ver heresia em toda a ideia que não tiver surgido no seu próprio caminho.

Ciência sem Deus é descalabro; Deus sem ciência é pão para as massas, sem sal nem miolo; Ciência e Deus sem Filosofia, são dogmas no mármore frio; Filosofia por si mesma acaba em cepticismo absoluto, e num eterno patinar na lama.

quarta-feira, agosto 10, 2005

Reflexão sobre o liberalismo e a sociedade ocidental

A sociedade em que vivemos, dita ocidental, é fruto essencialmente da Revolução Francesa,da emancipação da burguesia, e sua ascensão a classe dirigente.
Podemos afirmar que, na fachada dos direitos do homem e do cidadão, culminar do pensamento dos filósofos liberais - Diderot, Voltaire, Rosseau, Condorcet - a verdadeira revolução significou menos uma afirmação dos valores humanos e universais do que uma ascensão - há muito reívindicada - da burguesia. Quero com isto dizer que a afirmação desta classe implicou mudanças claras a nível político e social, na sociedade europeía dos séculos XVIII, XIX, e até XX.
Mais tarde, já durante a Primeira Revolução Industrial, o poder firmou-se na mãos de quem possuía os meios de produção. Capitalistas endinheirados cujo objectivo primordial era o lucro.
Progressivamente, a nobreza de sangue ou de linhagem começou a perder prestígio dando lugar à burguesia rica que, ao controlar os meios de produção, rapidamente se imiscuiu nos poderes estabelecidos e a assumiu valores aristocráticos. Não raramente se compravam titulos.
Neste contexto, a aristocracia de linhagem foi arrastando na sua queda a Igreja, e os seus privilégios.
Em França, a 4 de Agosto de 1789, os privilégios do Clero e da nobreza são abolidos, arrastando consigo a Monarquia do Ancient Regime. Em Inglaterra a Monarquia mantêm-se, apesar das reformas liberais que lhe dão um cunho parlamentar. Em Portugal, aquando da Constituição Liberal de 1822, dá-se a perda de privilégios da aristocracia de linhagem, apesar de só no século XX a Igreja ter perdido de facto a sua influência, com Afonso Costa e as Leis de Separação da Igreja do Estado.
Para o que pretendo neste pequeno ópusculo, é importante reiterar a afirmação de que as revoluções liberais foram o culminar da afirmação da burguesia como classe dominante. A própria Revolução Francesa baseou-se nos ideais iluministas do direito natural à propriedade privada.
Como sucede quando a liberdade é tomada como um meio de domínio, e não como um fim em sim mesma a respeitar per se, a burguesia industrial que foi surgindo impôs a sua vontade capitalista de domínio. Permitiu a exploração sobre uma classe que ia também surgindo, fruto do êxodo rural. Camponeses que procuravam na cidade opurtunidades que o campo não lhes proporcionava.
O proletariado possuía como única mais-valia a sua força de trabalho. Visto que no séc. XVIII não existiam apoios sociais nem sindicatos organizados, os operários estavam sujeitos aos caprichos dos seus propriétarios, ou exploradores, que os viam únicamente como meios de obtenção de lucro a curto prazo. Crianças, velhos, mulheres, todos tinham que trabalhar de sol a sol, sem fins-de-semana, férias, nem feriados. Nas periferias das grandes cidades cresciam os subúrbios. Bairros miseráveis e sujos, onde a promiscuidade vicejava. Os poucos tempos livres eram passados em tabernas, onde a desumanidade e a alienação se vingavam no alcoól.
Visto isto, estariam assim malogradas as aparentes conquistas liberais da Revolução Francesa, e desvelada a fachada das revoluções liberais.

Portugal

Os nossos tempos são tempos de materialismo.
Duzentos anos passados da Revolução Francesa e os direitos humanos continuam a ser violados de forma macabra. O que dela sobreviveu? Ideias, nada mais que isso. Se na teoria há liberdade, se na teoria se afirmam valores, na prática o liberalismo venceu, embora que apenas no âmbito material. Compreendo as objecções mais imediatas: aboliu-se a escravatura, a democracia está mais viva que nunca, etc. pergunto-me se não continuam a haver escravos. E não falo só nos países ditos de terceiro mundo. Falo também nos países ditos desenvolvidos. Ainda há crianças que não vão à escola para ficarem a trabalhar; ainda há mulheres que são escravizadas nas suas próprias casas, sofrendo caladas e resignadas, vítimas dos maridos - estes por sua vez vítimas da alienação no trabalho -.
Em quantas fábricas e empresas não continua a haver exploração, não abrangidas pelos sindicatos, vítimas da íliteracia e da ignorância? A democracia venceu? O povo é realmente soberano, e se o é é-o com consciência? Conhecemos bem a política dos partidos que têm o dever de representar o povo, mas que frequentemente se representam a si mesmos e aos lobbys económicos que os suportam.
Estará a educação e o sistema de ensinorealmente adaptado à formação integral do cidadão consciente e responsável? Ou pelo contrário não será o sistema uma elaborada linha de montagem disposta de forma a especializar ou «domesticar» o cidadão, para as tarefas produtivas que a sociedade economicista lhe impõe?
Estou a fazer um esforço para não me referir a países como a Dinamarca, a Holanda, ou até a França, visto que estes países são modelos em muitas questões, até pelo facto de terem encontrado um interessante equilíbrio entre o económico e o cultural. À formação profissional especializada, está necessáriamente relacionada uma formação humana, artistica e filosófica, não só fomentada pelo sistema de ensino mas também pelos governos e pela sociedade em geral, que lhe atribui o devido valor. O mesmo já não se pode dizer de Portugal, onde a cultura se não vende, não vale a pena. O que interessa é muito futebol, muita literatura ausonia, e muito lixo televisivo.
Dese a época dos descobrimentos que Portugal não toma a dianteira em nada. Todo o aparente progresso que se foi gerando desde então é puro efeito de arrastamento. As ideias, a indústria, os transportes. Em tudo Portugal se esforça por percorrer os caminhos já percorridos pelos outros. Isto é perigoso por duas razões: primeiro porque nos leva a uma progressiva perda de identidade, fazendo acreditar que tudo o que é português é atrazado; em segundo lugar, a pressa de nos igualarmos a países que consideramos desenvolvidos levou e leva a que atabalhoemos projectos ditos catalizadores de desenvolvimento, de uma forma pouco estrutural e irresponsável. Acontece agora com o TGV e a OTA como aconteceu no passado com os caminhos-de-ferro, com Fontes Pereira de Melo.