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domingo, julho 17, 2016

Angústia existencial


(Foto: por Filipe Pimentel)


A angústia existencial tem muito que ver com a consciência dolorosa de que se fica sempre aquém do que se pode realizar e ser, do que se pode de mais alto pensar e sentir; a consciência do desperdício da vida, por medo ou comodismo. É a dor de uma alma que se sente capaz de grandes e belos feitos, que sente vocação de imortalidade... e no entanto, se sente limitada e como que condenada a uma circunstância de vida da qual se sente incapaz de se libertar. E tanto maior é a consciência e a dor dessa limitação, quanto maiores são os seus sonhos e aspirações, quanto mais alto é aquilo que pode pensar e sentir. A consciência recorrente deste confronto entre o sonho e a realidade aparentemente intransponível da limitação, entre a pulsão vital do ilimitado e a limitação circunstancial que, de forma angustiada, se julga intransponível, tem de cada vez o sabor de uma pequena morte; tem o sabor amargo do tédio e do absurdo. E este sentimento fere mais por se saber que o tempo é curto, e que se vai morrer.

É isto a angústia.

Como ultrapassar isto? Muitas vezes, fica-se à espera. À espera de um resgate. Espera-se que a libertação venha de fora. E às vezes vem, mas só dura realmente se formos capazes de tomar as rédeas da nossa salvação, se estivermos dispostos a assumir até ao fim, sem medo ou desânimo, covardia ou preguiça, todas as consequências, boas ou menos boas, agradáveis ou dolorosas, das nossas completas escolhas. Escolhas que se tomam integralmente (ou que às vezes nos tomam integralmente), sem olhar para trás. Os germens do medo e do comodismo, da dependência e do desânimo, estão sempre em nós, nunca nos abandonam verdadeiramente, mesmo depois de vencidas as pontuais circunstâncias limitadoras. É que, para além de vencermos as circunstâncias, temos de saber vencer-nos a nós próprios, a todo o momento – e isto é o essencial de toda a sabedoria. Estamos sempre em risco de “cair” numa nova dependência, num novo estado inferior de limitação e pobreza de espírito, frequentemente iludidos de que se tratou de uma escolha real, quando na verdade fomos sim determinados pela nossa fraqueza, cedemos ao encantamento de sereia do fácil e cómodo. Depois da comodidade, vem a angústia – mas então já nos acomodamos, inclusive à própria angústia, que é o pior! Não há nada mais pernicioso para um espírito do que uma angústia acomodada, ou um comodismo angustiado.

A ausência de luta jamais foi sinónimo de paz. A verdadeira paz, que é paz de consciência, exige luta permanente, e contínua vigília e atenção. Luta e vigilância contra as tentações do medo, do fácil e do cómodo, que às vezes se rebuçam em falsas possibilidades de escolha. Luta, que é trabalho, para manter vivos os sonhos, claras as ideias e os propósitos, vigorosas as forças, as faculdades, as virtudes e os afetos. Luta que, bem orientada na direção de uma vocação ou horizonte de vida, se traduz em verdadeira paz - a paz que nasce do movimento (não da mera agitação), que como Einstein dizia recorrendo à analogia do ciclista, é a única forma de manter o equilíbrio na vida.