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sexta-feira, abril 21, 2006

Sobre caminhar

Continuo em busca de mim mesmo. Sigo por caminhos escolhidos, veículos de procura e de aperfeiçoamento pessoal. Caminhei por montes e vales, por estradas quentes, por riachos, apoiei-me no meu «cajado ecuménico» cada vez com mais força, como que pedindo dele uma resposta para a minha inquietação. Depois de ter provado o travo do amor verdadeiro, aquele que nos enche com alegria e serenidade de espírito; depois de ter vivido sonhos e ter recebido escolhos, o mesmo vazio, a mesma inquietação ainda se move no meu espírito, ainda que parte da resposta tenha sido obtida, ainda que tenha aprendido que na vida só as perguntas e as pedras do caminho contam realmente…
Não tenho dúvidas agora de que a vida em comunidade fraterna nos enche quase na totalidade, preenchendo aqueles vazios interiores da falta de integração, e desviando-nos o pensamento das questões ditas existenciais, que muitas vezes mais não são do que o resultado do não saber de facto viver. Não tenho dúvidas de que o destino do homem reside no aperfeiçoamento da vida em comum, na diluição progressiva do individualismo selvagem (nunca do individuo), e na consciência de grupo e de unidade, fundamental para o crescimento do próprio eu como identidade. Porém, nesta sociedade de encontros e desencontros em que tudo são bocados, como dizia Pessoa, estes vislumbres são raros, prenúncios talvez do futuro mas tão efémeros quanto o empenhamento de quem por eles passa.
Há uma aprendizagem fundamental para se viver em comunidade. Exige-se sobretudo esforço, compreensão, abnegação, e para ligar tudo isto, Amor. Grande parte dos conflitos são provocados pelo egoísmo e pela falta de capacidade de ouvir e colocar-se no lugar do que está ao nosso lado. Viver em conjunto tem de significar entrega, serviço, abertura. No entanto não significa a perda da sua própria identidade, ou a dissolução da individualidade como uma gota num lago. Pelo contrário: quanto maior a integração maior deve ser a afirmação do próprio eu. Um grupo saudável tem de ser um veículo através do qual cada elemento possa caminhar até ele mesmo, e nunca para alguém diferente de si, ou para um alguém colectivo abstracto. Um comunidade que procure diluir o indivíduo acabará mais cedo ou mais tarde por se tornar uma comunidade do ressentimento, e é aí que entram em acção os mais terríveis instintos do homem: a vingança, o ódio velado, a violência. É verdade que o conflito pode ser evitado, mas porque a vida em comunidade é como uma tectónica de placas exigindo ajustamentos aqui e ali, há pequenos conflitos que são saudáveis e promovem a união. É importante que o indivíduo tenha presente que existe abertura e liberdade para exprimir as suas impressões e mais profundos sentimentos sem qualquer restrição. É a melhor forma de ver garantida a sua individualidade e de afastar o ressentimento.
Por tendência natural o homem tende a amar a igualdade, e a rejeitar a diferença. Sobretudo porque é no que é igual e familiar que o homem encontra algum controlo e domínio, ou sobre si, ou sobre o mundo, e muitas vezes o diferente acarreta consigo alguns riscos. Amar a diferença é o primeiro passo para o respeito, e consequentemente para uma vida comunitária mais saudável. A riqueza reside exactamente nesta abertura ao diferente e ao novo, e à constante readaptação a estes. Um grupo que tende à uniformização tende ao fechamento. O fechamento tende à entropia. A entropia acaba em pobreza absoluta, em estagnação. Não tarda que a inquisição seja a instituição predilecta… É por isto que a Lei como elemento normativo e organizador deve precaver-se contra a estagnação. Porque em todo o grupo há mais cedo ou mais tarde a tentação de legislar. Em primeiro lugar porque há um desejo de conservar em base sólidas determinadas conquistas – elemento conservador; se o grupo se deu bem segundo determinadas linhas de orientação então há que registá-las para que não se percam. -. Em segundo lugar porque há uma tendência em qualquer grupo para a institucionalização, no sentido de se cristalizar como um facto garantido e pleno de direitos perante a comunidade social. E é neste ponto que reside o maior perigo. Porque determinadas conquistas são obtidas a lei pode tender à dogmatização, contrária à abertura e ao movimento essencial e fundamental em qualquer grupo. A lei pode não ser mais do que a materialização em leis cristalizadas de uma lei tácita, que deixa de estar presente nos elementos e na intuição colectiva de um grupo, para se exteriorizar a estes e consequentemente desumanizar-se. Cuidado com a lei, principalmente quando deixa de partir do coração para passar a partir do mármore em que foi gravada. A própria norma não deve tornar-se um fim em si mesma para o qual tende e de onde parte a acção do grupo e dos seus elementos, mas só e apenas o meio através do qual se cumprem as condições essenciais à boa comunhão e ao atingir dos objectivos. A lei deve ser viva, e não um peso morto que impeça o saudável movimento e devir da comunidade. A lei é provisória porque define apenas a melhor solução encontrada até aquele momento para regular uma determinada circunstância. Veja-se a lei que define o crescimento de uma flor. Jamais esta evita que a flor se deixe de movimentar consoante o sol, ou feche ou abra o botão consoante é dia ou noite. Isto porque a lei que a define não é o fim em si mesma, mas o meio através da qual a flor aprende a adaptar-se. A lei orienta de forma abrangente, não determina objectivamente.

1 comentário:

Anónimo disse...

Looks nice! Awesome content. Good job guys.
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